"Ser educador é muito mais do que ser professor. Para ser educador, não basta conhecer teorias, aplicar metodologias, é preciso uma predisposição interna, uma compreensão mais ampla da vida, um esforço sincero em promover a própria autoeducação, pois o educador verdadeiro é aquele que, antes de falar, exemplifica; antes de teorizar, sente e antes de ser um profissional é um ser humano." (Incontri)


"É fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal forma que, num dado momento, a tua fala seja a tua prática." (Paulo Freire)


"Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para ensinar e para convencer, para corrigir e para educar na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e preparado para as boas obras” (2 Tm 3, 16-17)

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sábado, 27 de outubro de 2012

ALFRED ADLER E A PSICOLOGIA INDIVIDUAL



 

INTRODUÇÃO

 


Alfred Adler é o fundador do sistema holístico da Psicologia Individual, que procura compreender cada pessoa como uma totalidade integrada num sistema social – cada ser humano é uma entidade única, indivisível, coerente e unificada que tem sempre de ser considerada em relação ao contexto sócio-ecológico do qual é parte integrante.

Chamou Individual à sua psicologia porque salienta o que é único do indivíduo em vez das universalidades de comportamento descritas por Sigmund Freud.

Assenta em quatro princípios fundamentais: holismo, unidade do estilo de vida, interesse social ou sentimento de comunidade e importância do comportamento direcionado para um objetivo.

Para Adler a vida é essencialmente um movimento em direção a uma melhor adaptação ao ambiente, maior cooperação e altruísmo. O indivíduo não é guiado por energias inconscientes, não é vitimado por instintos nem condenado por forças culturais e experiências de infância; cada pessoa é o agente criativo da sua própria personalidade, do seu próprio estilo de vida, dirigindo e criando ativamente o seu próprio crescimento e futuro.

Os objetivos que as pessoas se propõem atingir e os modos característicos de lutarem para alcançá-los fornecem a chave para a compreensão do significado que atribuem às suas vidas.

A Psicologia Individual de Adler salienta os comportamentos explícitos e as suas conseqüências, defende que os conceitos devem ser concretos e relacionados com o comportamento real, não postula forças intangíveis e constructos profundos na psique e compreende o comportamento em termos de um contexto (ambiente físico e social) de que o indivíduo normalmente não se apercebe.

Embora Adler seja freqüentemente considerado um discípulo de Freud que, rebelando-se contra o seu mestre, acabou por desenvolver as suas ideias e construir a sua própria teoria, ele era na verdade um colega de Freud e não um neo-freudiano – a sua teoria está radicada no que escreveu no período anterior ao da sua associação à Sociedade Psicanalítica de Viena (Ellenberger, 1970; citado por Hjelle & Ziegler, 1981).

Adler afirmava que aprendera mais com os erros de Freud do que com os seus ensinamentos e nunca se considerou psicanalista. Nunca fez psicanálise, não aceitava a ênfase freudiana na sexualidade para explicar a neurose e grande parte da sua Psicologia Individual desenvolveu-se como antítese à teoria freudiana.


BIOGRAFIA

 


Alfred Adler nasceu em Penzig, um subúrbio de Viena, Áustria, a 7 de Fevereiro de 1870. Nascido o segundo de seis filhos de um mercador judeu de classe média, recordava a infância como infeliz e marcada por relações hostis com os irmãos, especialmente pelos ciúmes e rivalidade em relação ao seu irmão mais velho.

Apesar da sua proveniência de uma família judia, não foi muito influenciado por esta religião. Havia poucas crianças judias no local onde cresceu pelo que o seu sotaque e aparência geral permaneceram sempre mais vienenses do que judeus; em adulto converteu-se ao Protestantismo.

Nos primeiros dois anos gozava de uma relação muito próxima e forte com a mãe, relação essa que foi alterada pelo nascimento do seu irmão mais novo. Por esta altura passou a preferir o pai, tendo este mantido sempre Alfred como seu preferido.

A morte e a doença foram companheiras de Alfred Adler durante toda a infância. Foi uma criança fraca e cronicamente doente (sofria nomeadamente de raquitismo) pelo que não podia competir com o irmão mais velho ou outras crianças nos jogos físicos da infância. No entanto lutou muito para superar a sua fraqueza física e sempre que podia corria e brincava com outras crianças, junto das quais era popular, tendo ganho com os seus amigos um sentido de igualdade e auto-estima que não encontrava em casa.

Em criança foi confrontado com a morte por diversas vezes: aos 3 anos o seu irmão mais novo morreu no quarto que partilhavam; em duas ocasiões escapou, por pouco, de morrer atropelado; aos 5 anos contraiu uma pneumonia grave que foi mesmo considerada fatal – ao sobreviver decidiu que queria ser médico.

Foi um estudante medíocre nos primeiros anos de escola. O seu pai foi mesmo aconselhado a retirá-lo da escola secundária e empregá-lo como aprendiz de sapateiro, a única tarefa para a qual teria capacidades... No entanto, o pai encorajou-o a permanecer na escola e continuar os estudos e com o seu esforço e persistência acabou por tornar-se o melhor aluno da turma.

Em 1888, com 18 anos, entrou na Universidade de Viena para estudar Medicina. Começou nesta altura a interessar-se pelo Socialismo e a frequentar encontros políticos, tendo conhecido a sua mulher (Raissa Epstein, uma estudante russa da Universidade de Viena) num desses encontros. Adler é conhecido por ser muito independente, quase radical, muito argumentativo, adorando debater assuntos sociais e governamentais.

Recebeu o diploma de médico em 1895. Começou por exercer Oftalmologia, passou pela clínica geral e acabou por interessar-se por Neurologia e Psiquiatria. Em 1897 casou com Raissa, na Rússia, sem que a família tivesse qualquer conhecimento prévio do romance.

Em 1901, Adler defendeu o prestes a ser publicado A Interpretação dos Sonhos de Sigmund Freud, tendo este acabado por convidá-lo a juntar-se ao novo grupo de discussão de psicanálise (a futura Sociedade Psicanalítica de Viena). Entre 1902 e 1911 Adler foi um membro activo do círculo que evoluiu em torno de Freud, tendo mesmo (em 1910) sido presidente da Sociedade Psicanalítica e co-editor de um dos seus jornais, apesar de não ser um seguidor de Freud e nunca ter recebido treino em análise.

Em 1911 as divergências teóricas de Adler e Freud tornam-se irreconciliáveis e Adler demite-se do cargo de presidente da Sociedade Psicanalítica de Viena. As grandes divergências residiam essencialmente no ênfase de Adler no poder e não na sexualidade como motivação humana básica e também na importância atribuída ao ambiente social em detrimento dos processos inconscientes.

Abandona a Sociedade com mais 9 colegas que também achavam a Psicanálise demasiado rígida e intolerante para o pensamento independente e funda a sua própria organização, a Sociedade para a Psicanálise Livre, que em 1912 passou a chamar-se Sociedade para a Psicologia Individual, e que se foi expandindo gradualmente pela Europa.
Em 1916 foi mobilizado para o Exército Austro-Húngaro e trabalhou como médico do exército num hospital militar em Cracóvia. Ao voltar da guerra encontrou na Viena destruída uma atmosfera de reconstrução da nação, com programas de segurança social, habitação e saúde e reformas educativas.

Adler e os seus seguidores debruçaram-se sobre a educação – especialmente treino de professores, por acreditarem na importância de trabalhar com aqueles que moldam as mentes e caracteres dos jovens. Com o apoio do Ministro da Educação instalaram centros de orientação de crianças em escolas públicas, podendo desta forma as crianças e as suas famílias receber aconselhamento. As clínicas de Adler, constituídas principalmente por voluntários que ele próprio treinara, foram um esforço pioneiro no que agora se chama psiquiatria comunitária.

Nos anos 20 passou muito tempo a discursar pela Europa e Estados Unidos. Visitou os EUA pela primeira vez em 1926 e depois disso foi voltando, ficando de cada vez temporadas mais longas, durante as quais dava conferências, aulas e demonstrações práticas. Em 1927 foi nomeado Professor na Universidade de Columbia, em 1928 deu uma conferência na New School for Social Research em Nova Iorque e um ano depois voltou para dar mais uma série de palestras e demonstrações clínicas. Em pouco tempo passava apenas os verões em Viena. Com a ascensão de Hitler e a vaga totalitarista que assolava a Europa, Adler concluiu que a sua psicologia apenas poderia sobreviver nos EUA. Assim, em 1934, ele e a sua mulher mudaram-se para a cidade de Nova Iorque. Pouco depois aceitava um cargo de professor visitante de psicologia médica na Long Island Medical College, mantendo sempre a sua prática psiquiátrica privada.

Entre as duas grandes guerras formaram-se grupos Adlerianos em 20 países europeus e nos EUA, muito devido às inúmeras palestras que deu ao longo dos últimos anos da sua vida.

Alfred Adler morreu de ataque cardíaco em Aberdeen, na Escócia, a 28 de Maio de 1937, com 67 anos de idade, quando se encontrava numa digressão de conferências pela Europa.

Adler era um orador infatigável de grande espontaneidade e popularidade. Escritor prolífero, publicou cerca de 300 artigos e livros em vida. Os seus seguidores fundaram diversos jornais profissionais dedicados primeiramente à divulgação de artigos teóricos e de investigação sobre a psicologia individual.

Devemos considerar a ciência da natureza humana como uma arte que tem ao seu dispor os mais diversos instrumentos, arte estreitamente relacionada com todas as outras e a todas útil. (...) Seu primeiro objectivo deve ser ampliar nosso conhecimento dos seres humanos, isto é, habilitar-nos a poder cultivar e dirigir em nós próprios um melhor e mais completo desenvolvimento psíquico. -- Alfred Adler, A Ciência da Natureza Humana (1927)

ASPECTOS GERAIS DA TEORIA ADLERIANA

 


Conceitos Centrais: Sentimentos de Inferioridade e Compensação; Agressividade e Luta pela Superioridade; Objectivos de Vida e Finalismo Fictício; Estilos de Vida; Esquema de Apercepção; Self Criativo; Interesse Social; Cooperação.

PREMISSAS BÁSICAS:
 
  O indivíduo como uma entidade unificada e coerente
  A vida humana como uma luta dinâmica pela perfeição
  O indivíduo como entidade criativa e autodeterminada
  A integração social do indivíduo
  A subjectividade individual

INFLUÊNCIAS DE OUTRAS TEORIAS:
 
Alfred Adler, na construção da sua teoria, foi influenciado por uma série de outras teorias das quais as mais evidentes são: o Evolucionismo de Charles Darwin (o aspecto fundamental da vida de qualquer indivíduo é a adaptação ao ambiente – Individual Psychology stands firmly on the ground of Evolution and in the light of evolution regards all human striving as a struggle for perfection.Adler, citado por Frager & Fadiman, 1994); a Psicanálise de Sigmund Freud (apesar de nunca aceitar os conceitos de líbido ou o complexo de Édipo, foi muito influenciado por outras partes da teoria psicanalítica, como a importância das primeiras experiências infantis, da relação mãe-filho ou dos sonhos; a teoria adleriana não foi construída sobre a teoria freudiana e é antes uma posição teórica independente, desenvolvida frequentemente por oposição à visão de Freud); Friedrich Nietzsche (algumas das primeiras concepções teóricas de Adler são muito semelhantes às de Nietzsche, embora reformulações posteriores sejam mais abrangentes e se afastem um pouco da ideia; o conceito de interesse social de Adler opõe-se à perspectiva individualista de Nietzsche); os Objectivos Fictícios de Hans Vaihinger (este filósofo propôs o conceito de ficções sociais que embora não tenham bases reais transformam-se nos determinantes críticos do comportamento humano e considera que as pessoas são mais afectadas pelas suas expectativas do que pelas suas experiências reais, chamando a isto ficcionalismo. Adler defende que criamos um objectivo idealizado de adaptação perfeita e lutamos por ele, como se esse objectivo resultasse em sucesso, felicidade e segurança); o Holismo de Jan Smuts (Smuts acreditava que sistemas completos têm frequentemente propriedades distintas das que possuem as suas partes tomadas individualmente e que todos os indivíduos agem como um todo. Adler encontra na filosofia holista uma confirmação de algumas das suas ideias bem como uma base filosófica para a Psicologia Individual. There is a logic from the head; there is also a logic from the heart; and there is an even deeper logic from the whole.Adler, citado por Frager & Fadiman, 1994).

TEORIA ADLERIANA:
 
Algumas das mais importantes contribuições de Adler para a Psicologia dizem respeito ao complexo de inferioridade e à nossa necessidade de compensar os sentimentos de inferioridade.

Adler reparou que muitas pessoas com alguma característica inferior eventualmente compensavam essas fraquezas – basicamente, uma inferioridade orgânica pode levar a compensações, tornando a fraqueza de certo indivíduo na sua maior força. Na verdade, o que interessava Adler não era propriamente o defeito em si mas a atitude da pessoa em relação a esse defeito.

Algum tempo mais tarde adicionou à sua teorização inferioridades psicológicas ou sociais, além das já consideradas inferioridades resultantes de defeitos corporais ou orgânicos.

Adler também postulou que todos nós, espécie humana, temos uma predisposição para desenvolver sentimentos de inferioridade, já que nascemos muito fracos e morreríamos sem o prolongado período de dependência dos outros.

Durante bastante tempo somos dominados por poderosos adultos que, além de maiores, são mais inteligentes do que nós. Não é de estranhar que nos percepcionemos como inferiores e nos proponhamos a partir daí a compensar as nossas fraquezas.

 De um modo geral, a compensação é uma reacção adaptativa e positiva que nos permite aproximar do nosso potencial total; infelizmente, uma incapacidade de efetuar compensações adequadas pode originar um sentimento de inferioridade.

Adler acreditava que as experiências de vida de todas as crianças envolvem sentimentos de fraqueza, insuficiência e frustração. A luta pelo poder seria então das primeiras compensações infantis de um sentimento de inferioridade. Mais ainda, ele defendia que os sentimentos de inferioridade são a nossa mais importante motivação e que todo o progresso resulta da nossa tentativa de compensar esses sentimentos de inferioridade.
Eventualmente acabou por concluir que a nossa motivação básica é antes um impulso para lutar pela superioridade, pela perfeição, que resulta da tal necessidade de compensar os sentimentos de inferioridade e representa uma tentativa de alcançar poder ou força de modo a conseguirmos controlar melhor o ambiente. Embora este impulso de luta pela superioridade seja inato, cada pessoa vai orientá-lo de acordo com as particularidades da sua personalidade.

Adler adotou a ideia de que cada indivíduo desenvolve um objetivo de vida específico (o objetivo de dominar o ambiente é demasiado amplo para explicar as direções que as pessoas escolhem para a sua vida) que vai orientar o seu percurso. Este objetivo vai ser influenciado por experiências pessoais, valores, atitudes e personalidade e não é um alvo escolhido conscientemente.

Os objetivos de vida são sempre algo irrealistas e podem tornar-se neuroticamente sobrevalorizados se os sentimentos de inferioridade forem demasiado fortes. São estes objetivos que direcionam e dão sentido às nossas atividades; os nossos traços de personalidade não são inatos nem imutáveis mas apenas traços adotados como modos de orientação na tentativa de atingir o objetivo.

Para superar sentimentos de inferioridade, os indivíduos desenvolvem um estilo de vida, que faz de cada personalidade única: embora todos procurem ultrapassar os sentimentos de inferioridade infantil, embora todos persigam o mesmo objetivo básico, nenhum o faz exatamente da mesma maneira.

Segundo Adler, estilo de vida é o modo único que o indivíduo escolhe para perseguir o seu objetivo de vida; é uma forma integrada de adaptar-se e interagir com a vida em geral. Pelos cinco anos de idade o estilo de vida de cada indivíduo está basicamente determinado – novas experiências podem contribuir para pequenas oscilações mas a estrutura básica está moldada e adquirimos o estilo que vais caracterizar-nos ao longo de toda a vida.

Hábitos aparentemente isolados e traços comportamentais ganham significado como elementos do estilo e objetivo de vida de certo indivíduo pelo que problemas psicológicos e emocionais devem ser tratados neste contexto. Todo o estilo de vida tem de ser trabalhado em terapia já que um certo sintoma ou traço não é senão uma expressão do estilo de vida do indivíduo, que deve revelar-se em quatro dimensões: o auto-conceito, o self ideal, a imagem do mundo e as convicções éticas.

Faz parte do estilo de vida desenvolver uma concepção de self e de mundo, ou seja, aquilo a que Adler chamou esquema de a percepção, querendo com isto referir-se aos esquemas que construímos a partir da nossa interpretação subjetiva do que percepcionamos.

O que determina o nosso comportamento não é o mundo real mas a nossa concepção do mundo. Uma das mais interessantes ideias defendidas por Alfred Adler é que os seres humanos moldam as suas próprias personalidades e não se limitam a ser impotentemente governados por forças externas.

Codificamos e interpretamos experiências seletivamente e desenvolvemos assim um esquema de a percepção individualizado, formando um padrão de relação com o mundo que é distinto de todos os outros e pertence apenas a cada um de nós. Cada indivíduo é essencialmente livre e é, devido a essa liberdade, responsável pelas suas acções e pela sua vida.

A criatividade faz parte da natureza humana e traduz-se na capacidade de formular (consciente ou inconscientemente) objetivos e meios para alcançá-los que vai resultar no desenvolvimento de um plano de vida que organiza essa vida num estilo coerente. Para Adler, a formação dos objetivos e estilos de vida e do esquema de a percepção é essencialmente um ato criativo.

Integrado numa perspectiva holista, Alfred Adler encarava o Homem não apenas como um todo unificado mas também como parte do outros todos (família, comunidade, sociedade e humanidade). As nossas vidas e todas as nossas atividades desenrolam-se num contexto social.

Adler acreditava que só funcionando como membros cooperativos da sociedade podemos superar as nossas inferioridades (reais ou imaginadas). Por outro lado, a falta de cooperação e o resultante sentimento de inadequação e fracasso estão na origem dos estilos de vida neuróticos ou não adaptativos.

Assim, Adler desenvolve o conceito de interesse social, que é uma predisposição alimentada pela experiência para contribuir para a sociedade. Mais do que interesse pela sociedade, pelo outro, o conceito implica uma noção de sentimento de comunidade que introduz a ideia de interesse pelos outros não apenas para servir os nossos próprios objectivos mas para desenvolver um interesse pelos interesses dos outros.

De acordo com o seu ênfase nas influências sociais sobre a personalidade, Adler sugeriu que certos estilos de vida desenvolver-se-iam em função não apenas da relação entre pais e filhos mas também do tamanho da família, relações entre irmãos e a posição ordinal da criança na família.

Especificamente, argumentou que embora os irmãos tenham os mesmos pais e cresçam quase no mesmo cenário familiar, os seus ambientes sociais não são idênticos. Experiências como ser mais velho ou mais novo que os seus irmãos e estar exposto a atitudes e valores parentais que variam devido à chegada de mais crianças ou outras circunstâncias específicas criam condições únicas na infância que vão influenciar profundamente a formação do estilo de vida de qualquer indivíduo. Para Adler, a posição ordinal de uma criança na sua família é de particular importância mas é o significado que a criança atribui à situação que vai realmente determinar de que modo essa posição ordinal vai influenciar o seu estilo de vida.

Além disso, uma vez que as percepções são inevitavelmente subjectivas, qualquer criança, nascida em qualquer posição, pode criar para si qualquer estilo de vida. No entanto, certas características são freqüentemente encontradas nas crianças conforme sejam a mais velha da família, a mais nova, a do meio ou a única.

Adler considera que o crescimento psicológico é antes de mais um movimento do auto-centrado objetivo de superioridade pessoal para uma atitude de domínio construtivo do ambiente e de desenvolvimento socialmente útil. A luta construtiva pela superioridade, com um forte interesse social e cooperação, são o traço básico do indivíduo saudável.

As grandes tarefas com que cada indivíduo é confrontado são o trabalho, a amizade e o amor, uma vez que vivemos num lugar específico e temos de utilizar as suas características específicas a nosso favor, vivemos rodeados de outras pessoas às quais temos de aprender a adaptar-nos e vivemos em dois sexos de cuja relação depende o futuro da nossa raça. Segundo Adler, estas três tarefas estão interrelacionadas e sucesso numa conduz a sucesso nas outras; elas são no fundo aspectos diferentes do mesmo problema – como viver construtivamente no nosso ambiente.

Ao debruçar-se sobre os obstáculos ao crescimento psicológico, concluiu que há três condições que a dominarem a infância são especialmente negativas e tendem a resultar numa falta de interesse social, isolamento e um estilo de vida não cooperativo, baseado no objetivo irrealista da superioridade pessoal: crianças que sofrem de inferioridade orgânica (tendem a tornar-se muito auto-centradas e desenvolvem um sentimento de inferioridade e inabilidade para competir com as outras crianças que leva a que evitem a interação social; se superarem as suas dificuldades podem compensar extraordinariamente as fraquezas originais e desenvolver as suas capacidades a um nível incrível); crianças mimadas (têm dificuldade em desenvolver interesse social e cooperação e não têm confiança nas suas capacidades porque sempre tiveram quem fizesse por elas o que elas deviam ter feito sozinhas; em vez de cooperar com os outros tendem a fazer exigências unilaterais aos amigos e família); crianças negligenciadas (nunca conheceram o amor e a cooperação pelo que se torna extremamente difícil desenvolver estas capacidades; não têm confiança na sua aptidão para ser útil e ganhar o afeto e a estima dos outros: tendem a tornar-se adultos frios e duros).

A inferioridade física, o mimo e a negligência resultam freqüentemente em visões distorcidas do mundo, que levam a estilos de vida desadequados. Uma vez mais, Adler salienta que não é propriamente a experiência em si mas as percepções e conclusões da criança sobre a experiência que determinam o modo como prosseguirá a sua vida.

Estas três situações têm essencialmente em comum a aquisição de um sentimento de inferioridade, um objetivo de vida mais elevado e mais rígido e um estilo vivencial mais ou menos em contradição com as exigências da vida. Estas exigências tornam-se bastante claras sempre que o indivíduo se depara com uma situação nova para a qual, devido ao seu estilo de vida bem como às suas altíssimas expectativas, não está devidamente preparado.

DIFERENÇAS DA TEORIA DE FREUD (Phares, 1984):
 
Como já foi referido, a Psicologia Individual difere da Psicanálise em vários aspectos, nomeadamente:

  Não há instintos (Eros/Thanatos) nem entidades mentais (Id, Ego, Superego)
  Não há dicotomia consciente/inconsciente.

  Há muito mais ênfase na aprendizagem, no ambiente, nos mecanismo de defesa do Ego

  O método de tratamento não é bem descrito e a teorização é menos sistemática.

  Sublinhou problemas das relações familiares e afastou-se da esfera sexual.

  Enfatizou muitos tipos diferentes de objectivos (Adler falava de objectivos que motivavam o comportamento enquanto que Freud se referia aos instintos que provocariam o comportamento).

  Adler dava muita importância ao interesse social

INFLUÊNCIAS NOUTROS TEÓRICOS:
 
Adler influenciou profundamente o desenvolvimento da psicologia contemporânea, ainda que nem sempre lhe seja atribuída a devida importância. Muitos dos seus conceitos foram integrados noutras teorias.

O seu ênfase no interesse social como critério de saúde mental foi uma enorme contribuição para a psicoterapia; o seu interesse nos processos conscientes, racionais, originou a Psicologia do Eu; a sua teorização do esquema de apercepção é um precursor da teoria e terapia cognitiva; a sua preocupação com a influência das forças sociais no desenvolvimento da personalidade manifesta-se nas obras de Erich Fromm e Karen Horney.

A sua insistência nos aspectos volitivos e criativos da personalidade, no holismo, no papel dos valores no comportamento humano, influenciou directa ou indirectamente teóricos como Gordon Allport, Abraham Maslow, Rollo May, Viktor Frankl e Albert Ellis. É facilmente reconhecida a importância de ideias adlerianas como: sentimento de inferioridade e lutas compensatórias; inferioridade de um órgão e psicossomática; complexo de inferioridade; papel da negligência no desenvolvimento da personalidade anti-social; competência como marco de maturidade; auto-estima e cobiça do poder; conceito de estilo de vida; stress e adaptação; ordem de nascimento; auto-atualização e serviço para os outros; saúde psicológica; criatividade; papel do poder e da agressividade no comportamento humano; conceito de unidade da personalidade; importância de factores não sexuais para o desenvolvimento.

Atualmente o movimento Adleriano soma vários milhares de membros espalhados pelo mundo e compreende representantes de diversas disciplinas (incluindo psiquiatria, psicologia, assistência social e educação) bem como todo o tipo de pessoas interessadas na aplicação de conceitos adlerianos à vida familiar e ao desenvolvimento pessoal.

APLICAÇÃO DA PSICOLOGIA INDIVIDUAL

 


PERTURBAÇÃO PSICOLÓGICA
 
A perturbação psicológica ocorre quando um indivíduo se sente inferior e indigno de ocupar um lugar entre as outras pessoas. O interesse social, que é uma potencialidade inata de qualquer ser humano, não se desenvolve na presença de fortes sentimentos de inferioridade.

Estes são substituídos por uma luta compensatória pela superioridade pessoal, por um objetivo irrealista e inatingível de superioridade, tendo o indivíduo neurótico a tendência para encontrar desculpas que explicam por que é que o objetivo nunca é atingido.

 Comportamentos ou sintomas neuróticos servem para estas desculpas, recebendo as atitudes que justificam este comportamento inútil o nome de lógica privada. Os indivíduos psicóticos na presença de certas condições predisponentes fogem completamente da lógica da vida social e adotam uma realidade de ilusões e alucinações que se ajusta à sua lógica privada.

Os psicopatas rejeitam abertamente o senso comum e, tal como os neuróticos e os psicóticos, são motivados apenas pelos próprios interesses, mas, ao contrário dos outros dois, não têm consciência disso; não precisam das desculpas e sintomas dos neuróticos nem da realidade distorcida dos psicóticos.

Não desenvolvemos sintomas ou comportamentos neuróticos enquanto sentimos que podemos funcionar adequadamente. A neurose vai desenvolver-se quando nos sentirmos incapazes de cumprir as obrigações de uma das tarefas da vida – o trabalho, as amizades, a relação íntima.

Os sintomas e comportamentos vão ser a desculpa para não realizar adequadamente as tarefas, não tentar sequer realizá-las ou desistir delas. Os neuróticos podem não parecer ter qualquer dificuldade até que se deparem com uma crise para a qual não se sentem preparados.

As pessoas sentem-se incapazes de encontrar o seu lugar na sociedade devido a vários graus de sentimento de inferioridade. Quando crianças aprenderam a sentir-se inferiores. A percepção de cada pessoa da posição que ocupa no quadro da sua família forma a base do seu estilo de vida.

Embora as pessoas possam não estar a cooperar e possam não estar a cumprir todas as tarefas da vida, desde que o seu estilo de vida esteja em harmonia com o ambiente não haverá comportamento perturbado ou sintomas angustiantes.

Por vezes algumas pessoas lamentam os seus sintomas e procuram tratamento para eles. Convencem-se a elas próprias e aos outros de que estão a esforçar-se por libertar-se dos sintomas ou do comportamento perturbante, mas os seus esforços só agravam e perpetuam os sintomas. A lógica privada dessa pessoa mantém os objetivos de vida irrealistas e errados.

O indivíduo está consciente das suas obrigações sociais mas devido à sua lógica privada continua com o seu comportamento inútil. A situação temida, a tarefa ou dever, e as obrigações de uma relação continuam a ser evitadas. Por vezes o sintoma é curado mas, se a sua função de segurança ainda é necessária, regressa ou é substituído por outro sintoma.

Para a teoria Adleriana, qualquer mudança comportamental é superficial se não for acompanhada por uma alteração da percepção e um aumento do interesse social. Substituir comportamentos inaceitáveis por outros mais adequados não constitui uma mudança do estilo de vida se o indivíduo continuar a não se sentir igual aos outros seres humanos.

NEUROSE – NATUREZA E TRATAMENTO
 
Para Adler, o termo neurose agrupava várias perturbações comportamentais devido às quais as pessoas procuravam ajuda especializada. Os sintomas por que estas perturbações se manifestavam serviriam a função de proteger a auto-estima, num processo relacionado com o objetivo de superioridade.

Umas das suas definições de neurose é Neurosis is the natural, logical development of an individual who is comparatively inactive, filled with a personal, egocentric striving for superiority, and is therefore retarded in the development of his social interest, as we find regularly among the more passive pampered styles of life.(Adler, 1956, The Individual Psychology of Alfred Adler: A systematic presentation in selections from his writings, citado por Hjeller & Ziegler, 1981).
Para Adler, as neuroses representam tentativas de superar sentimentos de inferioridade e adquirir uma sensação de competência. A neurose tende a isolar o indivíduo ao afastá-lo das relações sociais e da resolução de problemas real e ao limitar as suas relações com os outros por uma combinação de insegurança, auto-estima ameaçada, hipersensibilidade e intolerância.

 O neurótico tende a viver uma vida de imaginação e fantasia, evitar responsabilidades, perseguir um objectivo fictício egoísta de doença e sofrimento. O neurótico procura constantemente poder e prestígio pessoais, desculpando-se por deixar os problemas reais por resolver, e nunca desenvolve interesse social.

Há sempre um factor exógeno a precipitar verdadeiros sintomas num indivíduo com disposição neurótica. Perante a situação desencadeadora, com o estilo de vida já neurótico, o self criativo busca desesperadamente formas de proteger a auto-estima ameaçada bem como desculpas comportamentais para a situação vivida. Para curar a neurose, o terapeuta ajuda a alterar completamente a orientação do indivíduo (que resulta de toda a sua educação) e possibilita ao cliente tornar-se um membro da sociedade activo e interessado.

Os objectivos da terapia Adleriana resumem-se basicamente a reorganizar as crenças deturpadas sobre o próprio e os outros, eliminar objectivos patológicos e implementar novos objectivos de vida que permitam concretizar todo o potencial humano.

A PSICOTERAPIA ADLERIANA NA PRÁTICA
 
A Psicologia Individual distingue Psicoterapia (procura provocar uma mudança fundamental no estilo de vida do indivíduo) de Aconselhamento (procura alterar comportamentos dentro de certo estilo de vida).  A psicoterapia adleriana é encarada como uma reeducação das percepções defeituosas e valores sociais do cliente, bem como uma modificação da sua motivação. Pretende-se que os clientes se apercebam das suas ideias enganosas e objetivos irrealistas que são uma fonte de desencoraja mento; após esta primeira fase, segue-se uma segunda de reorientação dos objetivos e reajustamento dos conceitos e atitudes pessoais.

Os sentimentos de inferioridade dos clientes são suplantados por um crescente interesse social; sentem-se encorajados ao reconhecer que são iguais a qualquer outro ser humano e procuram contribuir e cooperar em vez de apenas apreciarem o seu estatuto pessoal nos grupos.

Não há nenhum estilo terapêutico pré-definido na psicoterapia adleriana. A relação estabelecida entre terapeuta e cliente é de igualdade e procura-se criar uma atmosfera de confiança e aceitação. Após uma breve descrição do problema, alguns terapeutas procuram recolher informação que lhes permita compreender o estilo de vida do cliente; outros preferem ir recolhendo essas informações ao longo da terapia.

O estilo do terapeuta vai variar de acordo com as necessidades do cliente, de modo a estabelecer empatia. O que se pretende é que o terapeuta vá gradualmente descobrindo e compreendendo a lógica privada do cliente, e expondo as suas interpretações na forma de hipóteses para que o cliente reconheça que são (ou não) interpretações corretas. Para que o processo resulte é necessário que ambos partilhem os mesmos (previamente acordados) objetivos.

O terapeuta Adleriano confia plenamente no cliente e demonstra a sua confiança ao atribuir-lhe toda a responsabilidade pela sua própria reorientação.

De uma forma muito resumida, a terapia Adleriana consiste em: Estabelecer uma relação de cooperação (entre iguais, com respeito mútuo e objetivos conjuntamente acordados; o cliente tem de sentir que o terapeuta se preocupa com ele mas não vai manipulá-lo, dominá-lo ou salvá-lo; a própria relação democrática é uma experiência ativa que faz parte do treino do cliente), Recolher informação e compreender o estilo de vida do cliente (para que seja possível mostrar-lhe de que forma o problema apresentado se encaixa no seu padrão geral característico; presta-se atenção ao comportamento verbal e não verbal e a dada altura é formulada a questão fulcral para Adler: “O que seria diferente se estivesse bem/não tivesse este sintoma?”.

A resposta vai revelar as áreas de dificuldade e os objectivos irrealistas), Avaliar o estilo de vida (consiste em compreender a constelação familiar do cliente e interpretar as suas primeiras memórias, já que o problema apresentado bem como problemas futuros vão resultar do padrão de vida básico), Interpretar e tomar consciência (o terapeuta expõe a sua interpretação do mundo do cliente de modo que esta possa se verificada e reconhecida pelo cliente.

O terapeuta contextualiza os problemas e preocupações com o estilo de vida do cliente e demonstra-lhe como certas situações, relações ou exigências podem provocar crises por desafiarem o seu estilo de vida.

Depois disto o cliente pode manter os sintomas neuróticos mas estes já não vão satisfazê-lo do mesmo modo) e, finalmente, Reorientar (o terapeuta vai utilizar uma técnica de espelho para mostrar ao cliente padrões familiares de movimento em direção a um objetivo em todos os seus comportamentos e vai atribuir-lhe tarefas que desafiam a sua lógica privada. Sempre que estas tarefas são cumpridas com sucesso, há um enfraquecimento da lógica privada do indivíduo).

Os clientes podem optar por uma mudança parcial ou completa, substituindo a sua lógica privada por senso comum, sentimentos de inferioridade por interesse social e um sentimento de pertença. O terapeuta tem sempre de respeitar o direito do cliente de decidir quando e quanto vai mudar. Cada indivíduo, se decidir mudar, vai fazê-lo do seu modo único e criativo.

A CIÊNCIA DA NATUREZA HUMANA (UNDERSTANDING THE HUMAN NATURE) DE ALFRED ADLER

 


Este livro constitui a expressão escrita de um ano de conferências semanais no Instituto Popular de Viena. As Conferências, dadas pelo Dr. Alfred Adler e com a presença de centenas de pessoas de sexos, idades e ocupações diferentes, debruçavam-se sobre a ciência da natureza humana e a técnica de viver.

Como é explicado no prefácio de W. Béran Wolfe, “A Ciência da Natureza Humana não é um tratado exaustivo de psicopatologia e sim uma introdução ao estudo dos multiformes problemas das neuroses, em linguagem acessível aos adultos instruídos.”

A obra é composta por uma Introdução, dois Livros e um Apêndice. O primeiro livro intitula-se O Procedimento Humano e contém oito capítulos: A Alma, Aspectos Sociais da Vida Psíquica, A Criança e a Sociedade, O Mundo em que Vivemos, O Senso de Inferioridade e a Luta pela Consideração, A Preparação para a Vida, O Homem e a Mulher e O Quadro da Família. O segundo livro tem o nome de A Ciência do Carácter e é composto por cinco capítulos: Considerações Gerais, Traços Agressivos de Caráter, Traços Não Agressivos de Caráter, Outras Manifestações de Caráter e Sentimentos e Emoções.

Como já indiciado por estes títulos e confirmado pela leitura do livro, muitos e diversos temas atravessam A Ciência da Natureza Humana. Um dos mais importantes e interessantes prende-se com a relevância da posição ordinal da criança na sua família para o seu desenvolvimento atual e futuro.

Embora esteja representada em diversas passagens ao longo da obra, esta temática recebe um tratamento mais aprofundado no capítulo VIII do primeiro livro, sob a designação “O Quadro da Família”.
Adler, de acordo com o seu ênfase nas influências sociais sobre a personalidade, defende que a base da formação do estilo de vida é a percepção que cada indivíduo tem da sua posição no quadro da sua família. Os pais estabelecem os valores familiares e criam a atmosfera familiar e as crianças decidem qual o seu papel nessa família.

É a posição da criança no seio da família que vai moldar as interações desta com o mundo. Ser o filho mais velho, do meio, mais novo ou único são condições que originam singularidades no desenvolvimento de cada indivíduo, que desembocarão em atitudes gerais bem distintas.

Embora todos os estilos descritos sejam apenas possibilidades e não representem situações inevitáveis nem imutáveis, a posição ordinal na família dota habitualmente o indivíduo de certas características comuns a todos os que estão nessa mesma posição, já que determina a probabilidade de confronto com certos problemas.

O filho mais velho é como “um monarca destronado”. Foi durante algum tempo o único filho, provavelmente mimado e superprotegido, recebendo toda a atenção e carinho de pais inexperientes que procuram não errar em nada com o seu bebé.

A chegada de uma nova criança põe em perigo esta posição privilegiada do primogênito e pode ser uma experiência ameaçadora e traumática. Para tentar recuperar o que perdeu, a criança pode regredir a uma fase mais infantil ou tornar-se exigente ou destrutiva; esta luta é infrutífera já que, por mais que tente, nunca recuperará a posição que ocupava anteriormente.

Perante isto, o filho mais velho pode isolar-se e aprender a dominar estratégias para sobreviver sozinho e sem precisar de afeto ou aprovação de ninguém; pode, por outro lado, tornar-se conformista e assumir o papel de defensor das leis e princípios familiares, apreciando grandemente o seu poder pessoal e a autoridade em geral.
A educação do filho do meio tende a ser mais descontraída, já que os pais estão a repetir a experiência e estão menos ansiosos em relação ao sucesso do que anteriormente. Este filho nunca foi o único centro das atenções, não sendo portanto tão susceptível de ser ferido pela chegada de novos irmãos.

É no entanto constantemente estimulado, ou mesmo desafiado, para superar os feitos do irmão mais velho, podendo manifestar uma maior velocidade de desenvolvimento do que a exibida pelo seu irmão. É caracterizado por ser extremamente competitivo e ambicioso, orientado para um objetivo, usando todos os meios para superar o irmão mais velho.

Por outro lado, e uma vez que teve sempre pelo menos outro irmão por perto, adquire facilmente capacidades de cooperação e compromisso. A atitude das crianças do meio é dominada por um sentimento de ser menosprezado, esquecido, podendo procurar metas demasiado altas, buscando ficções inalcançáveis e desvalorizando as pequenas vitórias.

O filho mais novo representa geralmente um tipo especial, um filho privilegiado e tratado com maior solicitude. É o mais novo, o menor, o mais necessitado e cresce mimado por pais e irmãos que, mais velhos e independentes, ganham superioridade ao mantê-lo em posição de inferioridade.

Pode ser mimado, superprotegido e nunca destronado, tal como o filho único. Tem no entanto irmão com quem competir e luta para superá-los; isto pode levar a fortes sentimentos de inferioridade e competitividade e desejo de provar que é tão bom como os outros e capaz de fazer tudo.

Algumas crianças mais novas tornam-se os mais bem sucedidos membros das suas famílias; munidos de uma enorme motivação para superar os irmãos, são descritos como lutadores, só se mostrando satisfeitos quando obtêm a vitória.
Há também entre os filhos mais novos aqueles que, mantendo o desejo de superar os outros, não possuem a actividade e confiança necessárias para o fazer.

Fogem então dos seus deveres e tornam-se medrosos; adoptam uma ambição que os força a evitar situações que testem as suas capacidades e envolvem-se noutras situações que se desviam das necessidades da vida. Agem como se tivessem sido abandonados e transportassem um torturante sentimento de inferioridade.

Os filhos únicos encontram-se na posição singular de não ter irmãos com os quais competir e são excepcionalmente sujeitos a ser mimados. É provável que recebam demasiada atenção e desenvolvam características de dependência e auto-centração, esperando ser mimados e protegidos por todos.

Tendo sido sempre o foco das atenções da família, pode ser um grande choque descobrir, ao crescer, que não é o centro das atenções do mundo todo, já que nunca partilhou nem teve de competir pelo lugar que ocupa na sua família.

O filho único adquire facilmente a convicção de que tem grande valor e interpreta as atenções, recomendações e preocupações dos pais como indicadores da hostilidade do mundo exterior. Desenvolve medo de obstáculos e enfrenta-os de modo desajeitado e desajustado.

Tendo conhecido geralmente apenas o melhor da vida, limita-se a gozá-la enquanto os outros se ocupam daquilo de que precisa.

Estas são algumas (mas não todas) das condições resultantes do quadro familiar que podem exercer uma influência determinante no estilo de vida dos indivíduos.

Apesar destas tendências gerais, a dinâmica de cada família e de cada situação é única. Cada criança vai escolher individualmente os seus objetivo e interpretar de acordo com a sua lógica privada a sua posição na constelação familiar.

CONCLUSÃO

 


Alfred Adler teve, indubitavelmente, uma enorme influência na psicologia contemporânea. Conceitos que desenvolveu foram integrados por diversas correntes e aspectos da vida psicológica até aí não considerados revelaram-se, com a sua intervenção, determinantes para a compreensão dos indivíduos.

Apesar de tantas vezes confundido com um discípulo rebelde de Freud, Adler é actualmente reconhecido pelo seu próprio mérito e contribuições. Embora sejam apontadas algumas falhas à sua teoria, a Psicologia Individual foi (e continua a ser) uma valiosa técnica de intervenção psicoterapêutica, com resultados comprovados e inovações revolucionárias.

Foi com bastante satisfação que (re)descobri Alfred Adler e a sua Psicologia Individual. Longe de ser um fundamentalista dos pressupostos psicanalíticos, Adler integra na sua teoria noções de diversas proveniências que a enriquecem e fortalecem. O seu ênfase na importância dos factores sociais para o desenvolvimento e da interpretação subjectiva que cada indivíduo faz do seu mundo e das suas experiências dotam esta teoria de armas para combater todo e qualquer ataque que a ela se dirija.

Termino com uma frase de Alfred Adler que captou a minha atenção e que considero de grande interesse:

Those who have lost the belief in themselves always believe in something else...-- Adler (1926), Fundamentals of Individual Psychology



OBRAS CONSULTADAS:


Adler, A. (1924); Practica y Teoria de la Psicologia del Individuo; Editorial Paidos; Buenos Aires: 1953.

Adler, A. (1926); Fundamentals of Individual Psychology, in Journal of Individual Psychology, 26(1); Burlington, Maio de 1970; pp.36-49.
Adler, A. (1927); A Ciência da Natureza Humana; Companhia Editora Nacional; São Paulo: 1961.

Adler, A.(1930); La Educación de los Niños; Editorial Losada S.A.; Buenos Aires:1963.

Dryden, W.; Handbook of Individual Therapy; Sage Publications; London: 1996.

Fadiman, J. & Frager, R. ; Personality and Personal Growth; Harper Collifs College Publishers; New York: 1994.

Hall, C.S. & Lindzey, G.; Theories of Personality: Primary Sources and Research; John Wiley & Sons, Inc.; USA: 1965.
Hjeller, L. & Ziegler, D.; Personality Theories; McGraw-Hill Book Company; USA: 1981.

Phares, J.E.; Introduction to Personality; Scott, Foresman and Company; USA: 1984.

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