INTRODUÇÃO
Alfred
Adler é o fundador do sistema holístico da Psicologia Individual, que
procura compreender cada pessoa como uma totalidade integrada num
sistema social – cada ser humano é uma entidade única, indivisível,
coerente e unificada que tem sempre de ser considerada em relação ao
contexto sócio-ecológico do qual é parte integrante.
Chamou
Individual à sua psicologia porque salienta o que é único do indivíduo
em vez das universalidades de comportamento descritas por Sigmund Freud.
Assenta
em quatro princípios fundamentais: holismo, unidade do estilo de vida,
interesse social ou sentimento de comunidade e importância do
comportamento direcionado para um objetivo.
Para
Adler a vida é essencialmente um movimento em direção a uma melhor
adaptação ao ambiente, maior cooperação e altruísmo. O indivíduo não é
guiado por energias inconscientes, não é vitimado por instintos nem
condenado por forças culturais e experiências de infância; cada pessoa é
o agente criativo da sua própria personalidade, do seu próprio estilo
de vida, dirigindo e criando ativamente o seu próprio crescimento e
futuro.
Os
objetivos que as pessoas se propõem atingir e os modos característicos
de lutarem para alcançá-los fornecem a chave para a compreensão do
significado que atribuem às suas vidas.
A
Psicologia Individual de Adler salienta os comportamentos explícitos e
as suas conseqüências, defende que os conceitos devem ser concretos e
relacionados com o comportamento real, não postula forças intangíveis e
constructos profundos na psique e compreende o comportamento em termos
de um contexto (ambiente físico e social) de que o indivíduo normalmente
não se apercebe.
Embora
Adler seja freqüentemente considerado um discípulo de Freud que,
rebelando-se contra o seu mestre, acabou por desenvolver as suas ideias e
construir a sua própria teoria, ele era na verdade um colega de Freud e
não um neo-freudiano – a sua teoria está radicada no que escreveu no
período anterior ao da sua associação à Sociedade Psicanalítica de Viena
(Ellenberger, 1970; citado por Hjelle & Ziegler, 1981).
Adler
afirmava que aprendera mais com os erros de Freud do que com os seus
ensinamentos e nunca se considerou psicanalista. Nunca fez psicanálise,
não aceitava a ênfase freudiana na sexualidade para explicar a neurose e
grande parte da sua Psicologia Individual desenvolveu-se como antítese à
teoria freudiana.
BIOGRAFIA
Alfred
Adler nasceu em Penzig, um subúrbio de Viena, Áustria, a 7 de Fevereiro
de 1870. Nascido o segundo de seis filhos de um mercador judeu de
classe média, recordava a infância como infeliz e marcada por relações
hostis com os irmãos, especialmente pelos ciúmes e rivalidade em relação
ao seu irmão mais velho.
Apesar
da sua proveniência de uma família judia, não foi muito influenciado
por esta religião. Havia poucas crianças judias no local onde cresceu
pelo que o seu sotaque e aparência geral permaneceram sempre mais
vienenses do que judeus; em adulto converteu-se ao Protestantismo.
Nos
primeiros dois anos gozava de uma relação muito próxima e forte com a
mãe, relação essa que foi alterada pelo nascimento do seu irmão mais
novo. Por esta altura passou a preferir o pai, tendo este mantido sempre
Alfred como seu preferido.
A
morte e a doença foram companheiras de Alfred Adler durante toda a
infância. Foi uma criança fraca e cronicamente doente (sofria
nomeadamente de raquitismo) pelo que não podia competir com o irmão mais
velho ou outras crianças nos jogos físicos da infância. No entanto
lutou muito para superar a sua fraqueza física e sempre que podia corria
e brincava com outras crianças, junto das quais era popular, tendo
ganho com os seus amigos um sentido de igualdade e auto-estima que não
encontrava em casa.
Em
criança foi confrontado com a morte por diversas vezes: aos 3 anos o
seu irmão mais novo morreu no quarto que partilhavam; em duas ocasiões
escapou, por pouco, de morrer atropelado; aos 5 anos contraiu uma
pneumonia grave que foi mesmo considerada fatal – ao sobreviver decidiu
que queria ser médico.
Foi
um estudante medíocre nos primeiros anos de escola. O seu pai foi mesmo
aconselhado a retirá-lo da escola secundária e empregá-lo como aprendiz
de sapateiro, a única tarefa para a qual teria capacidades... No
entanto, o pai encorajou-o a permanecer na escola e continuar os estudos
e com o seu esforço e persistência acabou por tornar-se o melhor aluno
da turma.
Em
1888, com 18 anos, entrou na Universidade de Viena para estudar
Medicina. Começou nesta altura a interessar-se pelo Socialismo e a
frequentar encontros políticos, tendo conhecido a sua mulher (Raissa
Epstein, uma estudante russa da Universidade de Viena) num desses
encontros. Adler é conhecido por ser muito independente, quase radical,
muito argumentativo, adorando debater assuntos sociais e governamentais.
Recebeu
o diploma de médico em 1895. Começou por exercer Oftalmologia, passou
pela clínica geral e acabou por interessar-se por Neurologia e
Psiquiatria. Em 1897 casou com Raissa, na Rússia, sem que a família
tivesse qualquer conhecimento prévio do romance.
Em
1901, Adler defendeu o prestes a ser publicado A Interpretação dos
Sonhos de Sigmund Freud, tendo este acabado por convidá-lo a juntar-se
ao novo grupo de discussão de psicanálise (a futura Sociedade
Psicanalítica de Viena). Entre 1902 e 1911 Adler foi um membro activo do
círculo que evoluiu em torno de Freud, tendo mesmo (em 1910) sido
presidente da Sociedade Psicanalítica e co-editor de um dos seus
jornais, apesar de não ser um seguidor de Freud e nunca ter recebido
treino em análise.
Em
1911 as divergências teóricas de Adler e Freud tornam-se
irreconciliáveis e Adler demite-se do cargo de presidente da Sociedade
Psicanalítica de Viena. As grandes divergências residiam essencialmente
no ênfase de Adler no poder e não na sexualidade como motivação humana
básica e também na importância atribuída ao ambiente social em
detrimento dos processos inconscientes.
Abandona
a Sociedade com mais 9 colegas que também achavam a Psicanálise
demasiado rígida e intolerante para o pensamento independente e funda a
sua própria organização, a Sociedade para a Psicanálise Livre, que em
1912 passou a chamar-se Sociedade para a Psicologia Individual, e que se
foi expandindo gradualmente pela Europa.
Em 1916 foi mobilizado para o Exército Austro-Húngaro e trabalhou como médico do exército num hospital militar em Cracóvia. Ao
voltar da guerra encontrou na Viena destruída uma atmosfera de
reconstrução da nação, com programas de segurança social, habitação e
saúde e reformas educativas.
Adler
e os seus seguidores debruçaram-se sobre a educação – especialmente
treino de professores, por acreditarem na importância de trabalhar com
aqueles que moldam as mentes e caracteres dos jovens. Com o apoio do
Ministro da Educação instalaram centros de orientação de crianças em
escolas públicas, podendo desta forma as crianças e as suas famílias
receber aconselhamento. As clínicas de Adler, constituídas
principalmente por voluntários que ele próprio treinara, foram um
esforço pioneiro no que agora se chama psiquiatria comunitária.
Nos
anos 20 passou muito tempo a discursar pela Europa e Estados Unidos.
Visitou os EUA pela primeira vez em 1926 e depois disso foi voltando,
ficando de cada vez temporadas mais longas, durante as quais dava
conferências, aulas e demonstrações práticas. Em 1927 foi nomeado
Professor na Universidade de Columbia, em 1928 deu uma conferência na
New School for Social Research em Nova Iorque e um ano depois voltou para dar mais uma série de palestras e demonstrações clínicas. Em pouco tempo passava apenas os verões em Viena. Com
a ascensão de Hitler e a vaga totalitarista que assolava a Europa,
Adler concluiu que a sua psicologia apenas poderia sobreviver nos EUA.
Assim, em 1934, ele e a sua mulher mudaram-se para a cidade de Nova
Iorque. Pouco depois aceitava um cargo de professor visitante de
psicologia médica na Long Island Medical College, mantendo sempre a sua
prática psiquiátrica privada.
Entre
as duas grandes guerras formaram-se grupos Adlerianos em 20 países
europeus e nos EUA, muito devido às inúmeras palestras que deu ao longo
dos últimos anos da sua vida.
Alfred
Adler morreu de ataque cardíaco em Aberdeen, na Escócia, a 28 de Maio
de 1937, com 67 anos de idade, quando se encontrava numa digressão de
conferências pela Europa.
Adler
era um orador infatigável de grande espontaneidade e popularidade.
Escritor prolífero, publicou cerca de 300 artigos e livros em vida. Os
seus seguidores fundaram diversos jornais profissionais dedicados
primeiramente à divulgação de artigos teóricos e de investigação sobre a
psicologia individual.
Devemos
considerar a ciência da natureza humana como uma arte que tem ao seu
dispor os mais diversos instrumentos, arte estreitamente relacionada com
todas as outras e a todas útil. (...) Seu primeiro objectivo deve ser
ampliar nosso conhecimento dos seres humanos, isto é, habilitar-nos a
poder cultivar e dirigir em nós próprios um melhor e mais completo
desenvolvimento psíquico. -- Alfred Adler, A Ciência da Natureza Humana
(1927)
ASPECTOS GERAIS DA TEORIA ADLERIANA
Conceitos
Centrais: Sentimentos de Inferioridade e Compensação; Agressividade e
Luta pela Superioridade; Objectivos de Vida e Finalismo Fictício;
Estilos de Vida; Esquema de Apercepção; Self Criativo; Interesse Social;
Cooperação.
PREMISSAS BÁSICAS:
O indivíduo como uma entidade unificada e coerente
A vida humana como uma luta dinâmica pela perfeição
O indivíduo como entidade criativa e autodeterminada
A integração social do indivíduo
A subjectividade individual
INFLUÊNCIAS DE OUTRAS TEORIAS:
Alfred
Adler, na construção da sua teoria, foi influenciado por uma série de
outras teorias das quais as mais evidentes são: o Evolucionismo de
Charles Darwin (o aspecto fundamental da vida de qualquer indivíduo é a
adaptação ao ambiente – Individual Psychology stands firmly on the
ground of Evolution and in the light of evolution regards all human
striving as a struggle for perfection.Adler, citado por Frager &
Fadiman, 1994); a Psicanálise de Sigmund Freud (apesar de nunca aceitar
os conceitos de líbido ou o complexo de Édipo, foi muito influenciado
por outras partes da teoria psicanalítica, como a importância das
primeiras experiências infantis, da relação mãe-filho ou dos sonhos; a
teoria adleriana não foi construída sobre a teoria freudiana e é antes
uma posição teórica independente, desenvolvida frequentemente por
oposição à visão de Freud); Friedrich Nietzsche (algumas das primeiras
concepções teóricas de Adler são muito semelhantes às de Nietzsche,
embora reformulações posteriores sejam mais abrangentes e se afastem um
pouco da ideia; o conceito de interesse social de Adler opõe-se à
perspectiva individualista de Nietzsche); os Objectivos Fictícios de
Hans Vaihinger (este filósofo propôs o conceito de ficções sociais que
embora não tenham bases reais transformam-se nos determinantes críticos
do comportamento humano e considera que as pessoas são mais afectadas
pelas suas expectativas do que pelas suas experiências reais, chamando a
isto ficcionalismo. Adler defende que criamos um objectivo idealizado
de adaptação perfeita e lutamos por ele, como se esse objectivo
resultasse em sucesso, felicidade e segurança); o Holismo de Jan Smuts
(Smuts acreditava que sistemas completos têm frequentemente propriedades
distintas das que possuem as suas partes tomadas individualmente e que
todos os indivíduos agem como um todo. Adler encontra na filosofia
holista uma confirmação de algumas das suas ideias bem como uma base
filosófica para a Psicologia Individual. There
is a logic from the head; there is also a logic from the heart; and
there is an even deeper logic from the whole.Adler, citado por Frager
& Fadiman, 1994).
TEORIA ADLERIANA:
Algumas
das mais importantes contribuições de Adler para a Psicologia dizem
respeito ao complexo de inferioridade e à nossa necessidade de compensar
os sentimentos de inferioridade.
Adler
reparou que muitas pessoas com alguma característica inferior
eventualmente compensavam essas fraquezas – basicamente, uma
inferioridade orgânica pode levar a compensações, tornando a fraqueza de
certo indivíduo na sua maior força. Na verdade, o que interessava Adler
não era propriamente o defeito em si mas a atitude da pessoa em relação
a esse defeito.
Algum
tempo mais tarde adicionou à sua teorização inferioridades psicológicas
ou sociais, além das já consideradas inferioridades resultantes de
defeitos corporais ou orgânicos.
Adler
também postulou que todos nós, espécie humana, temos uma predisposição
para desenvolver sentimentos de inferioridade, já que nascemos muito
fracos e morreríamos sem o prolongado período de dependência dos outros.
Durante
bastante tempo somos dominados por poderosos adultos que, além de
maiores, são mais inteligentes do que nós. Não é de estranhar que nos
percepcionemos como inferiores e nos proponhamos a partir daí a
compensar as nossas fraquezas.
De
um modo geral, a compensação é uma reacção adaptativa e positiva que
nos permite aproximar do nosso potencial total; infelizmente, uma
incapacidade de efetuar compensações adequadas pode originar um
sentimento de inferioridade.
Adler
acreditava que as experiências de vida de todas as crianças envolvem
sentimentos de fraqueza, insuficiência e frustração. A luta pelo poder
seria então das primeiras compensações infantis de um sentimento de
inferioridade. Mais ainda, ele defendia que os sentimentos de
inferioridade são a nossa mais importante motivação e que todo o
progresso resulta da nossa tentativa de compensar esses sentimentos de
inferioridade.
Eventualmente
acabou por concluir que a nossa motivação básica é antes um impulso
para lutar pela superioridade, pela perfeição, que resulta da tal
necessidade de compensar os sentimentos de inferioridade e representa
uma tentativa de alcançar poder ou força de modo a conseguirmos
controlar melhor o ambiente. Embora este impulso de luta pela
superioridade seja inato, cada pessoa vai orientá-lo de acordo com as
particularidades da sua personalidade.
Adler
adotou a ideia de que cada indivíduo desenvolve um objetivo de vida
específico (o objetivo de dominar o ambiente é demasiado amplo para
explicar as direções que as pessoas escolhem para a sua vida) que vai
orientar o seu percurso. Este objetivo vai ser influenciado por
experiências pessoais, valores, atitudes e personalidade e não é um alvo
escolhido conscientemente.
Os
objetivos de vida são sempre algo irrealistas e podem tornar-se
neuroticamente sobrevalorizados se os sentimentos de inferioridade forem
demasiado fortes. São estes objetivos que direcionam e dão sentido às
nossas atividades; os nossos traços de personalidade não são inatos nem
imutáveis mas apenas traços adotados como modos de orientação na
tentativa de atingir o objetivo.
Para
superar sentimentos de inferioridade, os indivíduos desenvolvem um
estilo de vida, que faz de cada personalidade única: embora todos
procurem ultrapassar os sentimentos de inferioridade infantil, embora
todos persigam o mesmo objetivo básico, nenhum o faz exatamente da mesma
maneira.
Segundo
Adler, estilo de vida é o modo único que o indivíduo escolhe para
perseguir o seu objetivo de vida; é uma forma integrada de adaptar-se e
interagir com a vida em geral. Pelos
cinco anos de idade o estilo de vida de cada indivíduo está basicamente
determinado – novas experiências podem contribuir para pequenas
oscilações mas a estrutura básica está moldada e adquirimos o estilo que
vais caracterizar-nos ao longo de toda a vida.
Hábitos
aparentemente isolados e traços comportamentais ganham significado como
elementos do estilo e objetivo de vida de certo indivíduo pelo que
problemas psicológicos e emocionais devem ser tratados neste contexto.
Todo o estilo de vida tem de ser trabalhado em terapia já que um certo
sintoma ou traço não é senão uma expressão do estilo de vida do
indivíduo, que deve revelar-se em quatro dimensões: o auto-conceito, o
self ideal, a imagem do mundo e as convicções éticas.
Faz
parte do estilo de vida desenvolver uma concepção de self e de mundo,
ou seja, aquilo a que Adler chamou esquema de a percepção, querendo com
isto referir-se aos esquemas que construímos a partir da nossa
interpretação subjetiva do que percepcionamos.
O
que determina o nosso comportamento não é o mundo real mas a nossa
concepção do mundo. Uma das mais interessantes ideias defendidas por
Alfred Adler é que os seres humanos moldam as suas próprias
personalidades e não se limitam a ser impotentemente governados por
forças externas.
Codificamos
e interpretamos experiências seletivamente e desenvolvemos assim um
esquema de a percepção individualizado, formando um padrão de relação
com o mundo que é distinto de todos os outros e pertence apenas a cada
um de nós. Cada indivíduo é essencialmente livre e é, devido a essa
liberdade, responsável pelas suas acções e pela sua vida.
A
criatividade faz parte da natureza humana e traduz-se na capacidade de
formular (consciente ou inconscientemente) objetivos e meios para
alcançá-los que vai resultar no desenvolvimento de um plano de vida que
organiza essa vida num estilo coerente. Para Adler, a formação dos
objetivos e estilos de vida e do esquema de a percepção é essencialmente
um ato criativo.
Integrado
numa perspectiva holista, Alfred Adler encarava o Homem não apenas como
um todo unificado mas também como parte do outros todos (família,
comunidade, sociedade e humanidade). As nossas vidas e todas as nossas
atividades desenrolam-se num contexto social.
Adler
acreditava que só funcionando como membros cooperativos da sociedade
podemos superar as nossas inferioridades (reais ou imaginadas). Por
outro lado, a falta de cooperação e o resultante sentimento de
inadequação e fracasso estão na origem dos estilos de vida neuróticos ou
não adaptativos.
Assim,
Adler desenvolve o conceito de interesse social, que é uma
predisposição alimentada pela experiência para contribuir para a
sociedade. Mais do que interesse pela sociedade, pelo outro, o conceito
implica uma noção de sentimento de comunidade que introduz a ideia de
interesse pelos outros não apenas para servir os nossos próprios
objectivos mas para desenvolver um interesse pelos interesses dos
outros.
De
acordo com o seu ênfase nas influências sociais sobre a personalidade,
Adler sugeriu que certos estilos de vida desenvolver-se-iam em função
não apenas da relação entre pais e filhos mas também do tamanho da
família, relações entre irmãos e a posição ordinal da criança na
família.
Especificamente,
argumentou que embora os irmãos tenham os mesmos pais e cresçam quase
no mesmo cenário familiar, os seus ambientes sociais não são idênticos.
Experiências como ser mais velho ou mais novo que os seus irmãos e estar
exposto a atitudes e valores parentais que variam devido à chegada de
mais crianças ou outras circunstâncias específicas criam condições
únicas na infância que vão influenciar profundamente a formação do
estilo de vida de qualquer indivíduo. Para Adler, a posição ordinal de
uma criança na sua família é de particular importância mas é o
significado que a criança atribui à situação que vai realmente
determinar de que modo essa posição ordinal vai influenciar o seu estilo
de vida.
Além
disso, uma vez que as percepções são inevitavelmente subjectivas,
qualquer criança, nascida em qualquer posição, pode criar para si
qualquer estilo de vida. No entanto, certas características são
freqüentemente encontradas nas crianças conforme sejam a mais velha da
família, a mais nova, a do meio ou a única.
Adler
considera que o crescimento psicológico é antes de mais um movimento do
auto-centrado objetivo de superioridade pessoal para uma atitude de
domínio construtivo do ambiente e de desenvolvimento socialmente útil. A
luta construtiva pela superioridade, com um forte interesse social e
cooperação, são o traço básico do indivíduo saudável.
As
grandes tarefas com que cada indivíduo é confrontado são o trabalho, a
amizade e o amor, uma vez que vivemos num lugar específico e temos de
utilizar as suas características específicas a nosso favor, vivemos
rodeados de outras pessoas às quais temos de aprender a adaptar-nos e
vivemos em dois sexos de cuja relação depende o futuro da nossa raça.
Segundo Adler, estas três tarefas estão interrelacionadas e sucesso numa
conduz a sucesso nas outras; elas são no fundo aspectos diferentes do
mesmo problema – como viver construtivamente no nosso ambiente.
Ao
debruçar-se sobre os obstáculos ao crescimento psicológico, concluiu
que há três condições que a dominarem a infância são especialmente
negativas e tendem a resultar numa falta de interesse social, isolamento
e um estilo de vida não cooperativo, baseado no objetivo irrealista da
superioridade pessoal: crianças que sofrem de inferioridade orgânica
(tendem a tornar-se muito auto-centradas e desenvolvem um sentimento de
inferioridade e inabilidade para competir com as outras crianças que
leva a que evitem a interação social; se superarem as suas dificuldades
podem compensar extraordinariamente as fraquezas originais e desenvolver
as suas capacidades a um nível incrível); crianças mimadas (têm
dificuldade em desenvolver interesse social e cooperação e não têm
confiança nas suas capacidades porque sempre tiveram quem fizesse por
elas o que elas deviam ter feito sozinhas; em vez de cooperar com os
outros tendem a fazer exigências unilaterais aos amigos e família);
crianças negligenciadas (nunca conheceram o amor e a cooperação pelo que
se torna extremamente difícil desenvolver estas capacidades; não têm
confiança na sua aptidão para ser útil e ganhar o afeto e a estima dos
outros: tendem a tornar-se adultos frios e duros).
A
inferioridade física, o mimo e a negligência resultam freqüentemente em
visões distorcidas do mundo, que levam a estilos de vida desadequados.
Uma vez mais, Adler salienta que não é propriamente a experiência em si
mas as percepções e conclusões da criança sobre a experiência que
determinam o modo como prosseguirá a sua vida.
Estas
três situações têm essencialmente em comum a aquisição de um sentimento
de inferioridade, um objetivo de vida mais elevado e mais rígido e um
estilo vivencial mais ou menos em contradição com as exigências da vida.
Estas exigências tornam-se bastante claras sempre que o indivíduo se
depara com uma situação nova para a qual, devido ao seu estilo de vida
bem como às suas altíssimas expectativas, não está devidamente
preparado.
DIFERENÇAS DA TEORIA DE FREUD (Phares, 1984):
Como já foi referido, a Psicologia Individual difere da Psicanálise em vários aspectos, nomeadamente:
Não há instintos (Eros/Thanatos) nem entidades mentais (Id, Ego, Superego)
Não há dicotomia consciente/inconsciente.
Há muito mais ênfase na aprendizagem, no ambiente, nos mecanismo de defesa do Ego
O método de tratamento não é bem descrito e a teorização é menos sistemática.
Sublinhou problemas das relações familiares e afastou-se da esfera sexual.
Enfatizou muitos tipos diferentes de objectivos (Adler falava de
objectivos que motivavam o comportamento enquanto que Freud se referia
aos instintos que provocariam o comportamento).
Adler dava muita importância ao interesse social
INFLUÊNCIAS NOUTROS TEÓRICOS:
Adler
influenciou profundamente o desenvolvimento da psicologia
contemporânea, ainda que nem sempre lhe seja atribuída a devida
importância. Muitos dos seus conceitos foram integrados noutras teorias.
O
seu ênfase no interesse social como critério de saúde mental foi uma
enorme contribuição para a psicoterapia; o seu interesse nos processos
conscientes, racionais, originou a Psicologia do Eu; a sua teorização do
esquema de apercepção é um precursor da teoria e terapia cognitiva; a
sua preocupação com a influência das forças sociais no desenvolvimento
da personalidade manifesta-se nas obras de Erich Fromm e Karen Horney.
A
sua insistência nos aspectos volitivos e criativos da personalidade, no
holismo, no papel dos valores no comportamento humano, influenciou
directa ou indirectamente teóricos como Gordon Allport, Abraham Maslow,
Rollo May, Viktor Frankl e Albert Ellis. É facilmente reconhecida a
importância de ideias adlerianas como: sentimento de inferioridade e
lutas compensatórias; inferioridade de um órgão e psicossomática;
complexo de inferioridade; papel da negligência no desenvolvimento da
personalidade anti-social; competência como marco de maturidade;
auto-estima e cobiça do poder; conceito de estilo de vida; stress e
adaptação; ordem de nascimento; auto-atualização e serviço para os
outros; saúde psicológica; criatividade; papel do poder e da
agressividade no comportamento humano; conceito de unidade da
personalidade; importância de factores não sexuais para o
desenvolvimento.
Atualmente
o movimento Adleriano soma vários milhares de membros espalhados pelo
mundo e compreende representantes de diversas disciplinas (incluindo
psiquiatria, psicologia, assistência social e educação) bem como todo o
tipo de pessoas interessadas na aplicação de conceitos adlerianos à vida
familiar e ao desenvolvimento pessoal.
APLICAÇÃO DA PSICOLOGIA INDIVIDUAL
PERTURBAÇÃO PSICOLÓGICA
A
perturbação psicológica ocorre quando um indivíduo se sente inferior e
indigno de ocupar um lugar entre as outras pessoas. O interesse social,
que é uma potencialidade inata de qualquer ser humano, não se desenvolve
na presença de fortes sentimentos de inferioridade.
Estes
são substituídos por uma luta compensatória pela superioridade pessoal,
por um objetivo irrealista e inatingível de superioridade, tendo o
indivíduo neurótico a tendência para encontrar desculpas que explicam
por que é que o objetivo nunca é atingido.
Comportamentos
ou sintomas neuróticos servem para estas desculpas, recebendo as
atitudes que justificam este comportamento inútil o nome de lógica
privada. Os indivíduos psicóticos na presença de certas condições
predisponentes fogem completamente da lógica da vida social e adotam uma
realidade de ilusões e alucinações que se ajusta à sua lógica privada.
Os
psicopatas rejeitam abertamente o senso comum e, tal como os neuróticos
e os psicóticos, são motivados apenas pelos próprios interesses, mas,
ao contrário dos outros dois, não têm consciência disso; não precisam
das desculpas e sintomas dos neuróticos nem da realidade distorcida dos
psicóticos.
Não
desenvolvemos sintomas ou comportamentos neuróticos enquanto sentimos
que podemos funcionar adequadamente. A neurose vai desenvolver-se quando
nos sentirmos incapazes de cumprir as obrigações de uma das tarefas da
vida – o trabalho, as amizades, a relação íntima.
Os
sintomas e comportamentos vão ser a desculpa para não realizar
adequadamente as tarefas, não tentar sequer realizá-las ou desistir
delas. Os neuróticos podem não parecer ter qualquer dificuldade até que
se deparem com uma crise para a qual não se sentem preparados.
As
pessoas sentem-se incapazes de encontrar o seu lugar na sociedade
devido a vários graus de sentimento de inferioridade. Quando crianças
aprenderam a sentir-se inferiores. A percepção de cada pessoa da posição
que ocupa no quadro da sua família forma a base do seu estilo de vida.
Embora
as pessoas possam não estar a cooperar e possam não estar a cumprir
todas as tarefas da vida, desde que o seu estilo de vida esteja em
harmonia com o ambiente não haverá comportamento perturbado ou sintomas
angustiantes.
Por
vezes algumas pessoas lamentam os seus sintomas e procuram tratamento
para eles. Convencem-se a elas próprias e aos outros de que estão a
esforçar-se por libertar-se dos sintomas ou do comportamento
perturbante, mas os seus esforços só agravam e perpetuam os sintomas. A
lógica privada dessa pessoa mantém os objetivos de vida irrealistas e
errados.
O
indivíduo está consciente das suas obrigações sociais mas devido à sua
lógica privada continua com o seu comportamento inútil. A situação
temida, a tarefa ou dever, e as obrigações de uma relação continuam a
ser evitadas. Por vezes o sintoma é curado mas, se a sua função de
segurança ainda é necessária, regressa ou é substituído por outro
sintoma.
Para
a teoria Adleriana, qualquer mudança comportamental é superficial se
não for acompanhada por uma alteração da percepção e um aumento do
interesse social. Substituir comportamentos inaceitáveis por outros mais
adequados não constitui uma mudança do estilo de vida se o indivíduo
continuar a não se sentir igual aos outros seres humanos.
NEUROSE – NATUREZA E TRATAMENTO
Para
Adler, o termo neurose agrupava várias perturbações comportamentais
devido às quais as pessoas procuravam ajuda especializada. Os sintomas
por que estas perturbações se manifestavam serviriam a função de
proteger a auto-estima, num processo relacionado com o objetivo de
superioridade.
Umas das suas definições de neurose é Neurosis
is the natural, logical development of an individual who is
comparatively inactive, filled with a personal, egocentric striving for
superiority, and is therefore retarded in the development of his social
interest, as we find regularly among the more passive pampered styles of
life.(Adler, 1956, The Individual Psychology of Alfred Adler: A
systematic presentation in selections from his writings, citado por
Hjeller & Ziegler, 1981).
Para
Adler, as neuroses representam tentativas de superar sentimentos de
inferioridade e adquirir uma sensação de competência. A neurose tende a
isolar o indivíduo ao afastá-lo das relações sociais e da resolução de
problemas real e ao limitar as suas relações com os outros por uma
combinação de insegurança, auto-estima ameaçada, hipersensibilidade e
intolerância.
O
neurótico tende a viver uma vida de imaginação e fantasia, evitar
responsabilidades, perseguir um objectivo fictício egoísta de doença e
sofrimento. O neurótico procura constantemente poder e prestígio
pessoais, desculpando-se por deixar os problemas reais por resolver, e
nunca desenvolve interesse social.
Há
sempre um factor exógeno a precipitar verdadeiros sintomas num
indivíduo com disposição neurótica. Perante a situação desencadeadora,
com o estilo de vida já neurótico, o self criativo busca
desesperadamente formas de proteger a auto-estima ameaçada bem como
desculpas comportamentais para a situação vivida. Para curar a neurose, o
terapeuta ajuda a alterar completamente a orientação do indivíduo (que
resulta de toda a sua educação) e possibilita ao cliente tornar-se um
membro da sociedade activo e interessado.
Os
objectivos da terapia Adleriana resumem-se basicamente a reorganizar as
crenças deturpadas sobre o próprio e os outros, eliminar objectivos
patológicos e implementar novos objectivos de vida que permitam
concretizar todo o potencial humano.
A PSICOTERAPIA ADLERIANA NA PRÁTICA
A
Psicologia Individual distingue Psicoterapia (procura provocar uma
mudança fundamental no estilo de vida do indivíduo) de Aconselhamento
(procura alterar comportamentos dentro de certo estilo de vida). A
psicoterapia adleriana é encarada como uma reeducação das percepções
defeituosas e valores sociais do cliente, bem como uma modificação da
sua motivação. Pretende-se que os clientes se apercebam das suas ideias
enganosas e objetivos irrealistas que são uma fonte de desencoraja
mento; após esta primeira fase, segue-se uma segunda de reorientação dos
objetivos e reajustamento dos conceitos e atitudes pessoais.
Os
sentimentos de inferioridade dos clientes são suplantados por um
crescente interesse social; sentem-se encorajados ao reconhecer que são
iguais a qualquer outro ser humano e procuram contribuir e cooperar em
vez de apenas apreciarem o seu estatuto pessoal nos grupos.
Não
há nenhum estilo terapêutico pré-definido na psicoterapia adleriana. A
relação estabelecida entre terapeuta e cliente é de igualdade e
procura-se criar uma atmosfera de confiança e aceitação. Após uma breve
descrição do problema, alguns terapeutas procuram recolher informação
que lhes permita compreender o estilo de vida do cliente; outros
preferem ir recolhendo essas informações ao longo da terapia.
O
estilo do terapeuta vai variar de acordo com as necessidades do
cliente, de modo a estabelecer empatia. O que se pretende é que o
terapeuta vá gradualmente descobrindo e compreendendo a lógica privada
do cliente, e expondo as suas interpretações na forma de hipóteses para
que o cliente reconheça que são (ou não) interpretações corretas. Para
que o processo resulte é necessário que ambos partilhem os mesmos
(previamente acordados) objetivos.
O
terapeuta Adleriano confia plenamente no cliente e demonstra a sua
confiança ao atribuir-lhe toda a responsabilidade pela sua própria
reorientação.
De
uma forma muito resumida, a terapia Adleriana consiste em: Estabelecer
uma relação de cooperação (entre iguais, com respeito mútuo e objetivos
conjuntamente acordados; o cliente tem de sentir que o terapeuta se
preocupa com ele mas não vai manipulá-lo, dominá-lo ou salvá-lo; a
própria relação democrática é uma experiência ativa que faz parte do
treino do cliente), Recolher informação e compreender o estilo de vida
do cliente (para que seja possível mostrar-lhe de que forma o problema
apresentado se encaixa no seu padrão geral característico; presta-se
atenção ao comportamento verbal e não verbal e a dada altura é formulada
a questão fulcral para Adler: “O que seria diferente se estivesse
bem/não tivesse este sintoma?”.
A
resposta vai revelar as áreas de dificuldade e os objectivos
irrealistas), Avaliar o estilo de vida (consiste em compreender a
constelação familiar do cliente e interpretar as suas primeiras
memórias, já que o problema apresentado bem como problemas futuros vão
resultar do padrão de vida básico), Interpretar e tomar consciência (o
terapeuta expõe a sua interpretação do mundo do cliente de modo que esta
possa se verificada e reconhecida pelo cliente.
O
terapeuta contextualiza os problemas e preocupações com o estilo de
vida do cliente e demonstra-lhe como certas situações, relações ou
exigências podem provocar crises por desafiarem o seu estilo de vida.
Depois
disto o cliente pode manter os sintomas neuróticos mas estes já não vão
satisfazê-lo do mesmo modo) e, finalmente, Reorientar (o terapeuta vai
utilizar uma técnica de espelho para mostrar ao cliente padrões
familiares de movimento em direção a um objetivo em todos os seus
comportamentos e vai atribuir-lhe tarefas que desafiam a sua lógica
privada. Sempre que estas tarefas são cumpridas com sucesso, há um
enfraquecimento da lógica privada do indivíduo).
Os
clientes podem optar por uma mudança parcial ou completa, substituindo a
sua lógica privada por senso comum, sentimentos de inferioridade por
interesse social e um sentimento de pertença. O terapeuta tem sempre de
respeitar o direito do cliente de decidir quando e quanto vai mudar.
Cada indivíduo, se decidir mudar, vai fazê-lo do seu modo único e
criativo.
A CIÊNCIA DA NATUREZA HUMANA (UNDERSTANDING THE HUMAN NATURE) DE ALFRED ADLER
Este
livro constitui a expressão escrita de um ano de conferências semanais
no Instituto Popular de Viena. As Conferências, dadas pelo Dr. Alfred
Adler e com a presença de centenas de pessoas de sexos, idades e
ocupações diferentes, debruçavam-se sobre a ciência da natureza humana e
a técnica de viver.
Como
é explicado no prefácio de W. Béran Wolfe, “A Ciência da Natureza
Humana não é um tratado exaustivo de psicopatologia e sim uma introdução
ao estudo dos multiformes problemas das neuroses, em linguagem
acessível aos adultos instruídos.”
A
obra é composta por uma Introdução, dois Livros e um Apêndice. O
primeiro livro intitula-se O Procedimento Humano e contém oito
capítulos: A Alma, Aspectos Sociais da Vida Psíquica, A Criança e a
Sociedade, O Mundo em que Vivemos, O Senso de Inferioridade e a Luta
pela Consideração, A Preparação para a Vida, O Homem e a Mulher e O
Quadro da Família. O segundo livro tem o nome de A Ciência do Carácter e
é composto por cinco capítulos: Considerações Gerais, Traços Agressivos
de Caráter, Traços Não Agressivos de Caráter, Outras Manifestações de
Caráter e Sentimentos e Emoções.
Como
já indiciado por estes títulos e confirmado pela leitura do livro,
muitos e diversos temas atravessam A Ciência da Natureza Humana. Um dos
mais importantes e interessantes prende-se com a relevância da posição
ordinal da criança na sua família para o seu desenvolvimento atual e
futuro.
Embora
esteja representada em diversas passagens ao longo da obra, esta
temática recebe um tratamento mais aprofundado no capítulo VIII do
primeiro livro, sob a designação “O Quadro da Família”.
Adler,
de acordo com o seu ênfase nas influências sociais sobre a
personalidade, defende que a base da formação do estilo de vida é a
percepção que cada indivíduo tem da sua posição no quadro da sua
família. Os pais estabelecem os valores familiares e criam a atmosfera
familiar e as crianças decidem qual o seu papel nessa família.
É
a posição da criança no seio da família que vai moldar as interações
desta com o mundo. Ser o filho mais velho, do meio, mais novo ou único
são condições que originam singularidades no desenvolvimento de cada
indivíduo, que desembocarão em atitudes gerais bem distintas.
Embora
todos os estilos descritos sejam apenas possibilidades e não
representem situações inevitáveis nem imutáveis, a posição ordinal na
família dota habitualmente o indivíduo de certas características comuns a
todos os que estão nessa mesma posição, já que determina a
probabilidade de confronto com certos problemas.
O
filho mais velho é como “um monarca destronado”. Foi durante algum
tempo o único filho, provavelmente mimado e superprotegido, recebendo
toda a atenção e carinho de pais inexperientes que procuram não errar em
nada com o seu bebé.
A
chegada de uma nova criança põe em perigo esta posição privilegiada do
primogênito e pode ser uma experiência ameaçadora e traumática. Para
tentar recuperar o que perdeu, a criança pode regredir a uma fase mais
infantil ou tornar-se exigente ou destrutiva; esta luta é infrutífera já
que, por mais que tente, nunca recuperará a posição que ocupava
anteriormente.
Perante
isto, o filho mais velho pode isolar-se e aprender a dominar
estratégias para sobreviver sozinho e sem precisar de afeto ou aprovação
de ninguém; pode, por outro lado, tornar-se conformista e assumir o
papel de defensor das leis e princípios familiares, apreciando
grandemente o seu poder pessoal e a autoridade em geral.
A
educação do filho do meio tende a ser mais descontraída, já que os pais
estão a repetir a experiência e estão menos ansiosos em relação ao
sucesso do que anteriormente. Este filho nunca foi o único centro das
atenções, não sendo portanto tão susceptível de ser ferido pela chegada
de novos irmãos.
É
no entanto constantemente estimulado, ou mesmo desafiado, para superar
os feitos do irmão mais velho, podendo manifestar uma maior velocidade
de desenvolvimento do que a exibida pelo seu irmão. É caracterizado por
ser extremamente competitivo e ambicioso, orientado para um objetivo,
usando todos os meios para superar o irmão mais velho.
Por
outro lado, e uma vez que teve sempre pelo menos outro irmão por perto,
adquire facilmente capacidades de cooperação e compromisso. A atitude
das crianças do meio é dominada por um sentimento de ser menosprezado,
esquecido, podendo procurar metas demasiado altas, buscando ficções
inalcançáveis e desvalorizando as pequenas vitórias.
O
filho mais novo representa geralmente um tipo especial, um filho
privilegiado e tratado com maior solicitude. É o mais novo, o menor, o
mais necessitado e cresce mimado por pais e irmãos que, mais velhos e
independentes, ganham superioridade ao mantê-lo em posição de
inferioridade.
Pode
ser mimado, superprotegido e nunca destronado, tal como o filho único.
Tem no entanto irmão com quem competir e luta para superá-los; isto pode
levar a fortes sentimentos de inferioridade e competitividade e desejo
de provar que é tão bom como os outros e capaz de fazer tudo.
Algumas
crianças mais novas tornam-se os mais bem sucedidos membros das suas
famílias; munidos de uma enorme motivação para superar os irmãos, são
descritos como lutadores, só se mostrando satisfeitos quando obtêm a
vitória.
Há
também entre os filhos mais novos aqueles que, mantendo o desejo de
superar os outros, não possuem a actividade e confiança necessárias para
o fazer.
Fogem
então dos seus deveres e tornam-se medrosos; adoptam uma ambição que os
força a evitar situações que testem as suas capacidades e envolvem-se
noutras situações que se desviam das necessidades da vida. Agem como se
tivessem sido abandonados e transportassem um torturante sentimento de
inferioridade.
Os
filhos únicos encontram-se na posição singular de não ter irmãos com os
quais competir e são excepcionalmente sujeitos a ser mimados. É
provável que recebam demasiada atenção e desenvolvam características de
dependência e auto-centração, esperando ser mimados e protegidos por
todos.
Tendo
sido sempre o foco das atenções da família, pode ser um grande choque
descobrir, ao crescer, que não é o centro das atenções do mundo todo, já
que nunca partilhou nem teve de competir pelo lugar que ocupa na sua
família.
O
filho único adquire facilmente a convicção de que tem grande valor e
interpreta as atenções, recomendações e preocupações dos pais como
indicadores da hostilidade do mundo exterior. Desenvolve medo de
obstáculos e enfrenta-os de modo desajeitado e desajustado.
Tendo conhecido geralmente apenas o melhor da vida, limita-se a gozá-la enquanto os outros se ocupam daquilo de que precisa.
Estas
são algumas (mas não todas) das condições resultantes do quadro
familiar que podem exercer uma influência determinante no estilo de vida
dos indivíduos.
Apesar
destas tendências gerais, a dinâmica de cada família e de cada situação
é única. Cada criança vai escolher individualmente os seus objetivo e
interpretar de acordo com a sua lógica privada a sua posição na
constelação familiar.
CONCLUSÃO
Alfred
Adler teve, indubitavelmente, uma enorme influência na psicologia
contemporânea. Conceitos que desenvolveu foram integrados por diversas
correntes e aspectos da vida psicológica até aí não considerados
revelaram-se, com a sua intervenção, determinantes para a compreensão
dos indivíduos.
Apesar
de tantas vezes confundido com um discípulo rebelde de Freud, Adler é
actualmente reconhecido pelo seu próprio mérito e contribuições. Embora
sejam apontadas algumas falhas à sua teoria, a Psicologia Individual foi
(e continua a ser) uma valiosa técnica de intervenção psicoterapêutica,
com resultados comprovados e inovações revolucionárias.
Foi
com bastante satisfação que (re)descobri Alfred Adler e a sua
Psicologia Individual. Longe de ser um fundamentalista dos pressupostos
psicanalíticos, Adler integra na sua teoria noções de diversas
proveniências que a enriquecem e fortalecem. O seu ênfase na importância
dos factores sociais para o desenvolvimento e da interpretação
subjectiva que cada indivíduo faz do seu mundo e das suas experiências
dotam esta teoria de armas para combater todo e qualquer ataque que a
ela se dirija.
Termino com uma frase de Alfred Adler que captou a minha atenção e que considero de grande interesse:
Those who have lost the belief in themselves always believe in something else...-- Adler (1926), Fundamentals of Individual Psychology
OBRAS CONSULTADAS:
Adler, A. (1924); Practica y Teoria de la Psicologia del Individuo; Editorial Paidos; Buenos Aires: 1953.
Adler,
A. (1926); Fundamentals of Individual Psychology, in Journal of
Individual Psychology, 26(1); Burlington, Maio de 1970; pp.36-49.
Adler, A. (1927); A Ciência da Natureza Humana; Companhia Editora Nacional; São Paulo: 1961.
Adler, A.(1930); La Educación de los Niños; Editorial Losada S.A.; Buenos Aires:1963.
Dryden, W.; Handbook of Individual Therapy; Sage Publications; London: 1996.
Fadiman, J. & Frager, R. ; Personality and Personal Growth; Harper Collifs College Publishers; New York: 1994.
Hall, C.S. & Lindzey, G.; Theories of Personality: Primary Sources and Research; John Wiley & Sons, Inc.; USA: 1965.
Hjeller, L. & Ziegler, D.; Personality Theories; McGraw-Hill Book Company; USA: 1981.
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