Mike, figura de rua, que fazia voz e violão nos recantos, praças e praias de mosqueiro, distrito de Belém, PA. Um "mosqueirense" sem registro e sem documentos, desconhecido e abandonado pelos pais e que sempre
viveu nas ruas. Recebeu o nome Mike Pereira da
Silva, quando apresentado no programa Domingão do Faustão. Apesar de sua apresentação e de seu sucesso com a música, não gravou CD e continuou sem nada, afirmando ter sido roubado, apesar de algumas doações. "Ninguém ia passar o que
eu passei”, afirma, seguido de uma pausa, na qual a lucidez se
restabelece. “Como eu tiro outro cartão?
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URL: http://www.youtube.com/watch?v=rac9duJPFiA&feature=player_embedded
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http://folhadoprogresso.com/folha/modules/artigos/item.php?itemid=719Em meio ao soluço incontido, o homem de aparência debilitada e frágil balbuciava frases desconexas e quase incompreensíveis. A imagem era a de um ser humano que já sem esperança procurou a saída no álcool e nas drogas. Como muitos outros, ele já não sabia nem direito quem era. O cidadão estava algemado e visivelmente drogado.
Jogado no chão da delegacia, para onde foi levado depois de uma crise causada pelo excesso de drogas e entre os soluços e gemidos, ele pronunciou o próprio nome, Maike Pereira da Silva. Seria o nome de um desconhecido qualquer, mas muitos o conhecem, é o “Mike de Mosqueiro”.
“Zuumm”, sibila no ar o nunchaku improvisado com duas barras ligadas a uma corrente de ferro. A figura esquálida que impunha a arma de artes marciais brinca desajeitada. Desfere um chute e perde o equilíbrio. Apóia-se com as mãos e balança a cabeça, como se repreendesse a própria falta de talento. Está em seu mundo, a milhares de quilômetros dali. “Mike, chega mais. Tão querendo saber de ti”, grita um dos monitores da Clínica Força do Querer, na Ilha de Mosqueiro, distrito de Belém. Ele caminha em nossa direção apenas de short, com a cabeça raspada e o corpo cheio de cicatrizes.
Definitivamente, o tempo não tem sido bom para Mike do Mosqueiro. Morador de rua alçado ao status de celebridade instantânea, ele ganhou fama após ter uma de suas apresentações ao violão postadas no Youtube, em agosto de 2009.
Em poucos meses, sua versão de “Vem meu amor”, de Viviane Batidão, rebatizada por ele de “Tchananá”, recebeu dez milhões de acessos. O sucesso virtual garantiu a Mike uma oportunidade no quadro “Se vira nos 30”, do Domingão do Faustão (Rede Globo), no dia 14 de março deste ano. Uma semana depois, ele retornou a convite do programa e ganhou R$ 25 mil da produção. Muitos devem concordar que foram 15 minutos bem vividos. Mas Mike não compartilha da mesma opinião.
“Vacilaram comigo. Não quiseram olhar por mim. O certo era: ‘Vamos chamar o Mike, ver o que ele está sentindo’”, disse ele, durante entrevista no último dia 2. Mike estava internado há uma semana na Clínica Força do Querer, centro de recuperação de dependentes químicos, após um surto induzido pela combinação de bebida alcoólica e pasta de cocaína.
No dia 20 de outubro, Mike ameaçou pessoas com uma faca, na praça central da ilha, e depois tentou se matar. Somente depois de uma hora de negociação, a polícia conseguiu imobilizá-lo. Era a segunda tentativa de suicídio em menos de um mês. Em 20 de setembro, ele foi autuado em circunstâncias semelhantes, ao ameaçar se esfaquear no mesmo local, e enviado para tratamento. Fugiu menos de uma semana depois.
“ENGANADO”
Cabeça baixa, olhar vago, o indicador se movendo nervosamente, Mike agora vive repetindo: “Fui enganado por todos”. Abandonado pelos pais, ele sempre viveu nas ruas.
A passagem pela TV rendeu participações nos DVDs das cantoras de tecnomelody Viviane Batidão e Gaby Amarantos.
Em maio, ele foi convidado pelo Programa do Ratinho. A aparição na TV bancou o tratamento dentário do cantor, do qual só restam agora o implante dos dentes inferiores. Pouco depois, veio o ostracismo. “Ninguém mais quis saber de mim. Agora estão querendo me matar!”, fala alto, quase aos gritos, demonstrando que seu atual estado vai além de um simples coração partido.
Mike alega que está sofrendo atentados, acusa a “galera do tecnomelody” e pessoas ligadas à produção do DVD em que participou. Diz que está sendo perseguido por homens armados. “Usaram até um mini canhão contra mim”, delira. Conta que por vários dias vagou entre Belém e Mosqueiro, se escondendo.
SEM DOCUMENTOS
Durante uma das inúmeras tentativas de fuga, Mike perdeu os documentos. Na verdade ele nunca havia sido registrado. O nome pelo qual foi apresentado ao público em sua primeira ida ao Faustão, Mike Pereira da Silva, foi dado pela produção do programa. Junto com a recém-adquirida carteira de identidade, sumiu também o cartão da conta em que estava depositado o dinheiro recebido. Ele não sabe dizer o quanto gastou ou se ainda tem alguma coisa. “Mesmo sofrendo essas derrotas, essas mentiras, esses enganos, ao invés de ajudar a mim mesmo, eu ajudei aos outros. Dei fogão para os pequeninos, para fazer mingau. Ninguém ia passar o que eu passei”, afirma, seguido de uma pausa, na qual a lucidez se restabelece. “Como eu tiro outro cartão?”, suplica.
O período conturbado foi acompanhado, no início, pela cantora Viviane Batidão. “Eu falava direto com ele por telefone. Depois ele começou a inventar histórias, dizer que não precisava se preocupar com mais nada porque estava rico. As pessoas de Mosqueiro me contavam de suas bebedeiras e confusões. Até que um dia não tive mais notícias dele”, diz ela, que conheceu Mike durante sua apresentação no Domingão e se diz grata pelo encontro que lhe concedeu projeção nacional. Mas ressalta, no entanto, que nunca se aproveitou do cantor. “Eu tenho história. São quatro anos de carreira. No dia que eu precis ar usar outra pessoa para fazer sucesso, eu me aposento”, conclui.
Viviane afirma que está preocupada com o atual estado de Mike e que sempre percebeu algo “estranho” nele. “Nos bastidores, depois da nossa apresentação no Faustão, ele me contou uma história estranha. Disse que uma vez quase foi atropelado e voou por cima do carro”, relembra.
“Nunca ganhamos dinheiro com ele”
“Ele é louco da cabeça, ele não é normal”, afirma Meg Martins, produtora artística da Bis Entretenimento, responsável pela ida de Mike ao Faustão. Mike a acusa de ter ficado com parte de seu dinheiro e diz que os gastos com a viagem para participar do programa foram descontados, ao contrário do que teria sido combinado.
“Nunca ganhamos dinheiro por conta do Mike - pelo contrário, só gastamos”, afirma Meg Martins. Em sua defesa, afirma que o cantor dispôs da mesma infra-estrutura dos artistas contratados pela produtora - entre os quais os principais nomes do tecnomelody, como a própria Viviane Batidão. Garante ainda que a ida de Mike foi paga pela empresa, assim como o aluguel de um apartamento em Belém, na Braz de Aguiar, para que ele morasse. A ideia era assessorar o cantor para os shows que começavam a aparecer.
“Mike nunca foi nosso contratado. Eu o ajudava porque gostava dele. Surgiram duas propostas de show em Santa Catarina, para ganhar R$ 7 mil, e ele recusou. Tivemos que deixá-lo ir. A fama acabou e ele estava ficando cada vez mais agressivo”, conta a produtora.
Surtos e tentativas de suicídio
Os distúrbios são confirmados por Luciano Santos, coordenador da Clínica Força do Querer. “Nossos psicólogos atestaram confusão mental e paranóia, provavelmente em decorrência do abuso de substâncias químicas”, afirma. Na tarde da última sexta-feira, Luciano relatou que Mike sofreu novo surto, seguido de tentativa de suicídio, mas que naquele momento não se encontrava no centro de reabilitação. “Não podemos manter ninguém à força. Todos os nossos internos ficam aqui por vontade própria”, informou.
A clínica mantém cerca de 34 internos. No caso de Mike, que não possui família, o tratamento é bancado pela própria entidade. Luciano explica que ele ainda não está apto a participar das atividades do centro, que envolvem trabalhos coletivos e terapia. Enquanto não for submetido a tratamento psiquiátrico, não disponível na clínica, precisa ser mantido longe do convívio social. Nos dias em que está internado, Mike caminha pela horta coletiva ou fica deitado na rede. Mas sempre remoendo lembranças. Fala das roupas que ganhou e já não tem mais, do colchão novo onde nunca pôde dormir, do CD que não gravou, do violão novo perdido, do sucesso que acabou. Para ele, pior do que perder a fama de cantor, é ser visto como bandido. “Querem acabar comigo como fizeram com o Bruce Lee. Ele era bom, mas sofria na mão dos outros. Ficou famoso e mataram ele. Querem fazer o mesmo comigo”, diz, em posição de guarda, como quem espera o próximo golpe.
AJUDA
Para ajudar Mike do Mosqueiro entre em contato com o Centro de Recuperação Força do Querer, através dos telefones (91) 8138-7686 e 8714-3763.
(Diário do Pará)·